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O Infiltrado

Rodolfo Mendes

A pergunta: um filme com mais de duas horas e meia, trama extremamente detalhada, com um protagonista nada carismático e com nomes fáceis de confundir pode ser considerado bom?


A resposta: nesse caso sim.

A segunda empreitada de Robert De Niro no comando de uma câmera (a primeira foi há catorze anos com Desafio no Bronx) já pode despontar como um dos melhores do ano, mesmo com películas como Homem-Aranha 3 e 300 a caminho.

O Bom Pastor narra a ascensão e consolidação da CIA, a agência de inteligência norte americana, tendo como linha condutora um de seus integrantes. De Niro e seu roteirista Eli Roth tecem toda trama a partir de um episódio emblemático: a tentativa de invasão de Cuba por parte dos EUA pela Baía dos Porcos, em 1961. Como todos sabem, a operação americana foi um fiasco, e é nesse ponto que entra o protagonista Edward Wilson (um Matt Damon agora especializado em papéis pesados e silenciosos), personagem cujas características propositalmente lembram alguns dos lendários diretores da CIA.

Wilson acredita que informações sobre localização exata do início da investida americana vazaram da agência, e a chave para este mistério está numa foto, que é esmiuçada durante as duas primeiras horas do filme. Conforme os detalhes da imagem vão ganhando significado e acrescentando informações, quadros da narrativa não linear do filme contam a trajetória de Edward desde sua iniciação com membros do serviço secreto, antes da segunda guerra mundial.

A transformação de Edward, conforme sua escalada até o alto escalão da CIA, exibe os aspectos mais nocivos de uma cultura que coloca o trabalho e o ofício (e seus ossos) em primeiro lugar, sobre os valores aos quais eles devem dar suporte. Os relacionamentos amorosos e de amizade cultivados pelo protagonista vão se desmanchando até o ponto em que ele se torna um completo estranho para sua linda mulher (Angelina Jolie) e seu filho.

Mas conforme se envolve cada vez mais com seu trabalho de coordenador de espionagem, Edward também começa a entender cada vez mais seu inimigo (no caso, a inteligência da URSS) por conta das necessidades de seu trabalho, assim, pelos mesmos motivos que se torna uma figura fria para seus conhecidos, também se torna uma pessoa cada vez mais entendida e também compreendida pelos seus rivais do além-cortina de ferro.

De Niro nunca escondeu as amizades que tinha com membros e ex membros da CIA, e aproveitou seu conhecimento sobre a instituição para polir e refinar seu roteiro. Somou a isso o seu prestígio para obter bons atores e a produção de um roteiro primoroso, realizando uma bela obra, que mesmo densa e cheia de detalhes, foca e conta com pormenores a deterioração do calor humano de um homem que a cada decisão faz um sacrifício de si (com direito à todas as referências freudianas que alguém pode encontrar).

Contudo, o filme também deixa claro o porquê e o para quem todo esforço que Edward empenha na agência são dirigidos: para proteção daquele a quem ele de fato estima: seu filho (por quem faz um sacrifício que só ele sabe se dará resultado ou não).

Mas como atestar a verossimilhança sobre um assunto tão obscuro e que se mantém um mistério até mesmo para quem de fato participou dos acontecimentos? De Niro responde: "eu desafio qualquer um envolvido com a CIA a apontar algum detalhe do filme que seja um absurdo". Pelo menos até agora, ninguém disse nada.

O Bom Pastor (The Good Shepherd)

EUA, 2006

Direção: Robert De Niro Elenco: Matt Damon, Angelina Jolie, Alec Baldwin, Billy Crudup e Robert De Niro Duração: 167 min.