« Home | Casos do acaso » | Um pouco de realidade » | As Cores e os Sons da Cegueira » | “Assim externarei a lembrança de um passado sombrio” » | » | Ilusão de ótica » | Morte aos leões » | Jantando no Inferno » | O Infiltrado » | Por que você não me conta um segredo? »

Mais que sonhadores

Saulo Yassuda

"O ‘Jules e Jim’ brasileiro! O ‘Jules e Jim’ brasileiro" Foram essas as palavras que Caio Blat disse ter ouvido de muitos franceses no Festival de Biarritz, com a exibição de Proibido Proibir, do diretor chileno-brasileiro Jorge Durán.

Durán não gostou da comparação entre o longa francês e o brasileiro. Na pré-estréia de seu filme, no Espaço Unibanco de Cinema, em São Paulo, o diretor escarneceu: “não foi Truffaut que inventou o triângulo amoroso”.

Apesar do comentário de Durán, Proibido proibir trata de um triângulo amoroso, um triângulo cujos vértices têm nomes: Paulo, Leon e Letícia.

Paulo (Blat), estudante de medicina cujo lema é, cinicamente, “proibido proibir”, divide uma quitinete com seu melhor amigo, Leon (Alexandre Rodrigues), aluno de ciências sociais. As diferenças entre os dois já começam no futebol: o primeiro torce pelo Botafogo, o segundo é Flamenguista. Enquanto Paulo usa drogas, leva uma vida boêmia e aparentemente sem se preocupar com o mundo que o cerca, Leon já é um rapaz engajado, politicamente correto e que desenvolve um programa social com crianças carentes. Leon namora Letícia (Maria Flor), romântica e, ao mesmo tempo, forte estudante de arquitetura por quem também Paulo se apaixona.


O conflito amoroso entre os estudantes vai ser cruzado e, ao mesmo tempo, agitado por uma trama paralela, de viés mais social. O trio resolve ajudar uma paciente terminal do Hospital Universitário a rever seu filho, perseguido por policiais corruptos. É nesse momento que os três jovens de classe média se embrenham nas favelas cariocas e deparam-se com a verdadeira realidade “podre” do mundo (num recorte distinto da recente safra de filmes nacionais). Em um dos momentos de maior densidade do longa, Letícia desabafa: “Tá tudo podre. A gente se finge de cego pra não ver”.


O inconformismo político, não necessariamente engajado – o que diz muito respeito à geração atual –, do trio mais seus conflitos amorosos se enlaçam de forma harmoniosa e coerente, o que resulta num filme bonito, fluente e verossímil, com diálogos bastante densos. Durán credita todo o realismo com que o cotidiano e o interior das personagens são construídos aos seus alunos universitários. Professor de cinema, ele autoriza que o pessoal “coloque o dedo” no filme, que exponha suas idéias e realize mudanças. Durán autoriza o mesmo aos atores. O final, por exemplo, seria diferente – segundo ele – se essas “mexidas” no roteiro não fossem autorizadas.

Proibido proibir tem um desfecho em aberto dos mais bonitos do cinema nacional. Assim como o restante de todo o filme, não há idealização, não há saídas fáceis, há a realidade de um rito de passagem de três jovens para a vida adulta.

Colaborou também para a qualidade do longa o elenco de jovens atores, com destaques sobretudo a Caio Blat, que consolida seu lugar no cinema nacional, e a Maria Flor (subaproveitada agora em telenovelas globais). Outro ponto alto do filme são as locações na zona norte carioca, incomum no cinema nacional (acomodado ao binômio zona sul / morros cariocas).


Proibido proibir é mais um filme sobre triângulos amorosos, mas não é só um filme de triângulos amorosos. É um filme sobre se inconformar, um filme sobre lutar, um filme sobre crescer.


Proibido proibir

(Brasil / Chile – 2006)

Direção: Jorge Durán

Elenco: Caio Blat, Alexandre Rodrigues, Maria Flor

Duração: 100 min.