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Uma "cigana" a solta

Tatiane Ribeiro


Até onde um amor não correspondido pode acabar com a vida de uma pessoa? Mesmo com a solidão, será que alguém estaria disposto a largar sua vida e ficar andando sem nenhum destino pelas ruas, passando fome e frio, apenas porque se sente triste?

Difícil de acreditar que exista alguém como Zingarina. Depois de ser abandonada pelo namorado na França e ser rejeitada por ele na Transilvânia (ela vai até lá para reencontrá-lo, supondo que ele havia sido deportado), ela foge da amiga Marie (Amira Casar) e fica perambulando pelas estradas da Transilvânia como uma criança de rua, comendo o que lhe dão e dormindo em qualquer lugar, sem nenhuma perspectiva. O que torna a trama ainda mais irreal é o fato de Zangarina estar g
rávida e nem ao menos se lembrar disso na hora de cometer a sua loucura.

A fascinação do diretor argelino Tony Gatlif pela cultura cigana talvez tenha sido o seu maior erro. Na tentativa de misturar a história da jovem Zingarina (Asia Argento, numa atuação incrível) com o povo cigano da Transilvânia, acaba não conseguindo seguir nem para um lado nem para o outro, fazendo um filme confuso e sem profundidade.

Na continuidade da história, Zingarina reencontra Tchangalo (Birol Ünel), um vendedor de ouro e outras coisas que compra de pessoas humildes, que ela conhecera em um bar enquanto procurava por Milan (Marco Castoldi), seu namorado. Tchangalo, após uma cena completamente maluca, em que ele a vê vestida de cigana e começa a rir loucamente, passa a levá-la consigo. Ele mora em seu carro, e dorme e come na rua, pagando hotel apenas para se lavar.


O filme, aparentemente, é uma tentativa de
misturar um problema social (o preconceito da sociedade em relação aos ciganos) com um romance fora dos padrões. Cenas de sexo e diálogos cheios de ódio cultural tentam chocar o espectador, mas só conseguem ser mais um fio solto dessa trama sem nenhuma conexão com qualquer coisa.

Tchangalo e Zingarina são as peças principais desse romance em que aparência, posses e sanidade mental são as últimas coisas que importam. Quando se está só, qualquer coisa parece ser melhor que nada. Os opostos, nesse caso, não se atraem, pel
o contrário, já que são dois malucos juntos numa jornada sem nexo.

Há que se dar, apesar de todos os defeitos do longa, os devidos créditos à trilha sonora, que foi, sem dúvidas, um espetáculo a parte (definitivamente merecedora do prêmio Cannes de Melhor Música de 2006). A música regional romena torna o filme mais interessante e cheio de alegria. No decorrer da trama, é a música que dá um ritmo mais acelerado, deixando o espectador com o pensamento tão alucinado quanto o da protagonista.

No fim, é fácil entender porque Milan fugiu tão bruscamente de Zingarina. Ninguém conseguiria casar com alguém como ela. Neurótica, maluca, impulsiva e sem o menor amor próprio. Ninguém, só Tchangalo, um personagem que confunde liberdade com insanidade.



Transylvania (Transylvania)
França, 2006
Direção: Tony Gatlif
Elenco: Asia Argento, Amira Casar e Birol Ünel
Duração: 103
min